Já
faz algum tempo que não olho para minha cristaleira, tão antiga e tão cheia de
vida.
Talvez
movida pelos apelos afetivos desta época de tantas recordações estou
especialmente voltada para dentro de mim mesma.
Hoje,
dia 30 de dezembro, quase finalizando este ano de tantas emoções, chegou a hora
de revisitar todas as promessas que fiz para mim mesma no final do ano passado.
Na verdade não foram muitas, mas foram suficientes para entender que minhas
promessas são dívidas, as quais só me lembro quando não há mais tempo para
nada.
Talvez
por esta razão as promessas são praticamente as mesmas todos os anos.
E
corro pular ondinhas imaginárias. Preparo a ceia com cuidado, a mesa enfeitada
e linda, o traje branco escolhido com primor.
Faço
votos de paz, dinheiro, amor, saúde e trabalho para todos que amo.
Mas...
o que foi feito deste ano de 2015? Não foram os mesmos votos que fiz no final
de 2014?
Desta
vez, além dos votos tradicionais (também essenciais) quero encerrar este ano
com simplicidade e transparência.
Escolhi
uma xícara de vidro, para poder ver as cores brilhantes e límpidas do meu cha
de camomila, cuidadosamente servido neste fim de 2015.
Quero
a calma necessária para a experiência única de viver com simplicidade. Quero a
sabedoria necessária para reconhecer dentro de mim tudo aquilo que me é
indispensável conservar.
Também
quero rever meus conceitos e abrir mão de tudo aquilo que não me faz falta, ou
pior, que me faz mal.
Só
não posso abrir mão do aprendizado de ter vivido o que vivi em 2015. O
aprendizado de ter vivido tudo o que vivi até agora. O aprendizado de tudo o que ainda vou viver até o dia em que minha antiga cristaleira
finalmente fechar suas portas marcadas pelo tempo e os espelhos dentro dela
pararem de refletir minha essência.
Pensando
bem, este é o único voto que faço para o novo ano que está por vir... sabedoria!
Vou
pegar emprestada a sabedoria generosa de Rubem Alves para tentar expressar meus
votos de Ano Novo. Em seu livro “Ostra feliz não faz pérola” este
grande conhecedor da alma das ostras divide conosco o segredo de uma bela
pérola.
Se
o ano que passou não foi fácil e trouxe pedras no lugar de pérolas... não me
queixo. Abro a cristaleira e vejo minha imagem lá refletida, naquele espelho
embaçado do tempo. Escolho a xícara, preparo o cha de camomila e... voilà...
Abro
cuidadosamente minha ostra para buscar dentro dela a bela pérola que vem sendo
preparada ao longo de minha experiência de viver.
Afinal,
como diz o tradutor das ostras...
Ostra
feliz não faz pérola. A ostra, para fazer uma pérola, precisa ter dentro de si
um grão de areia que a faça sofrer. Sofrendo a ostra diz para si mesmo:
“Preciso
envolver essa areia pontuda que me machuca com uma esfera lisa que lhe tire as
pontas…” Ostras felizes não fazem pérolas… Pessoas felizes não sentem a
necessidade de criar. O ato criador, seja na ciência ou na arte, surge sempre
de uma dor. Não é preciso que seja uma dor doída… Por vezes a dor aparece como
aquela coceira que tem o nome de curiosidade.
Estes
são meus votos para 2016... que minha coceira curiosa possa criar belas
pérolas, lisas, brilhantes, cheias de minha experiência de viver.
Aceita
um cha de camomila?
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